segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Ao amor...


'' Eu quero fazer o elogio do amor puro, do amor cego, do amor estúpido, do amor doente, do único amor verdadeiro que há, estou farto de conversas, farto de compreensões, farto de conveniências de serviço. Nunca vi namorados tão embrutecidos, tão cobardes e tão comodistas como os de hoje. Incapazes de um gesto largo, de correr um risco, de um rasgo de ousadia, são uma raça de telefoneiros e capangas de cantina, malta do "tá bem, tudo bem", tomadores de bicas, alcançadores de compromissos, banancides, borra-botas, matadores do romance, romanticidas.
Já ninguém se apaixona? Já ninguem aceita apaixão pura, a saudade sem fim, a tristeza, o desequilibrio, o medo, o custo, o amor, a doenla que é como um cancro a comer o coração e que nos canta no peito ao mesmo tempo? O amor é uma coisa a vida é outra. O amor não é para ser uma ajudinha. Não é para ser alivio, o repouso, o intervalo, a pancadinha nas costas, a pausa que refresca, o pronto-socorro da tortura estrada da vida, o nosso ''dá lá um jeitinho sentimental''.
Para onde quer que se olhe, já não se vê romance, gritaria, maluquice, abraços e flores. O amor fechou a loja.
Amor é amor. É essa beleza. É esse perigo. O nosso amor não é para nos compreender, não é para nos ajudar, não é para nos fazer feliz. O nosso amor não é para nos amar, para nos levar de repente ao céu, a tempo de apanhar um bocadinho de inferno aberto.
A vida às vezes mata o amor. A ''vidinha'' é uma convivência assassina. O amor puro não é um meio, não é um fim, não é um precipicio, não é um destino. O amor não se percebe. Não é para perceber. O amor é um estado de quem se sente. O amor é a nossa alma. É a nossa alma a desatar. A desatar a correr atras do que não sabe, não apanha, não larga, não compreende. O amor é uma verdade. É por isso que a ilusão é necessaria. A ilusão é bonita, não faz mal. Que se invente e minta e sonhe o que quiser. A realidade pode matar, o amor é mas bonito que a vida. A vida que se lixe.
Num momento, num olhar, o coração apanha-se para smepre. Ama-se alguem. Por muito longe, por muito dificil, por muito desesperadamente. O coração guarda o que nos escapa das mãos. E durante o dia e durante a vida, quando não está lá quem se ama, não é ele que nos acompanha - é o nosso amor, o amor que se lhe tem.
Só um mundo de amor pode durar a vida inteira. E valê-la tambem.''

Autor: Miguel Esteves Cardoso

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